Faça parte de nossa comunidade!

Coloquemos a poesia como alimento essencial para a evolução da alma dos nossos conterrâneos!!!

sábado, 5 de maio de 2012

Chico Buarque - Construção

 Depois de um período turbulento, mas muito significativo e cheio de transformações - graças a Deus, todas positivas - hoje reinicio as postagens neste blog. Criado exatamente para difundir a poesia para os admiradores desta arte, o poema escolhido para abrir essa retomada é  Construção, música de Chico Buarque de Hollanda.

 Esta composição é um prato cheio para os amantes de poesia, a começar pelo título, que se refere tanto ao cenário da construção civil, quanto a própria construção do poema. A história do personagem se modifica, conforme Chico alterna na segunda e terceira estrofe apenas as duas últimas palavras dos versos que utilizou na primeira estrofe. Ou seja, ele cria uma história ao modificar algumas palavras de lugar, atribuindo aos versos então um novo sentido, logo, construindo uma nova história, ou, um outro ponto de vista. "Pródigo" é a única palavra que ele utiliza na segunda estrofe, que não utilizou na primeira.

 Um outro detalhe interessante para reparar é que a última palavra dos versos - da primeira, segunda e terceira estrofe - é sempre proparoxítona. Leia com atenção o poema, e tire suas próprias conclusões.

Chico Buarque - Construção


Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego

Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho seu como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público

Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado

Por esse pão pra comer, por esse chão prá dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir,
Deus lhe pague

Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair,
Deus lhe pague

Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir,
Deus lhe pague

Nenhum comentário:

Postar um comentário